Minicurso a ser ministrado no II Simpósio Nacional de Estudos Criptojudaicos (SINACRIPTO), promovido pelo Grupo de Pesquisa Diáspora Atlântica dos Sefarditas da Universidade Federal de Sergipe, dos dias 19 a 21 de junho de 2017. Programação do evento disponível em: <http://sefarditas.net.br/iisina/index.html>.

INTRODUÇÃO

Os mais proeminentes estudiosos da vida e obra de Judá Abravanel (Leão Hebreu) são recorrentes em destacar que seu pensamento foi fortemente marcado pela Cabala e pelo neoplatonismo. Esta dupla característica de sua formação está alicerçada em duas fontes primordiais de ensino: a casa paternal e a sinagoga. No primeiro ambiente, junto a seus irmãos, Judá Abravanel cresceu à sombra de seu pai Isaac Abravanel, líder judeu em toda Península Ibérica, também conhecida como Sefarade. De Isaac, Judá aprendeu os fundamentos da Torá, a interpretação mosaica da Cabala, e a inserção nos meandros da política na Corte portuguesa, onde fora conselheiro e financista. Na respeitada sinagoga de Lisboa, foi-lhe transmitido o programa de estudos comum às destacadas famílias judaicas de sua época, que incluíam tesouros da sabedoria ocidental, além de fontes árabes, gregas, hebraicas e latinas.

Fugindo de intrigas palacianas, o clã dos Abravanel vai abrigar-se no Reino de Espanha em 1483, dali partindo para Itália por causa do Edito de Expulsão dos judeus promulgado em 1492. Inicia-se uma vivência de ser-em-exílio. Como se sabe hoje, ao chegarem em Nápoles, a família Abravanel iniciou um intenso processo de mediação cultural com a intelectualidade renascentista italiana. Samuel, irmão de Judá Abravanel, abriu a casa da família para constantes estudos da Cabala (VILA-CHÃ, 2001, p. 21). Era uma época em que cristãos renascentistas estabeleceram com os judeus um processo de abertura e troca de saberes, aprendendo a língua hebraica para estudo da Torá e dos segredos da Cabala (IDEL, 2015b, p. 457). Pico della Mirandola, J. Alemanno, Marsílio Ficino estavam entre os que buscaram a Cabala para diversas aplicações da magia, inclusive na música (IDEL, 2015b, p. 498).

PROBLEMATIZAÇÃO

Enquanto James Novoa (2009a) entendia que os Diálogos de Amor eram um sistema filosófico incomum que tinha por pretensão “revelar os segredos primordiais do saber” (NOVOA, 2009a, p. 89), cumpre ainda entender como Judá Abravanel dialogava com outros intelectuais de sua época, visto que eram tempos em que o constante perigo de ser descoberto, perseguido, espoliado, torturado e morto, impunha ao judeu desterrado o caráter social e político do segredo como mecanismo de defesa e autopreservação. Destaque-se, também, que a escrita neoplatônica de Judá Abravanel, bem recebida pelas vertentes renascentistas judaica e cristã de seu tempo, ocultava uma estrutura de ensino da Cabala, como aprendida dos sábios teólogos judeus, os quais muito teriam influenciado a filosofia de Platão, assim entendia Leão Hebreu.

OBJETIVOS

Com a presente investigação, objetiva-se entender a exposição da Cabala interpretada pelo clã Abravanel e que está presente no texto dos Diálogos de Amor de Judá Abravanel, construído sobre um duplo modo de escrita, exotérico e esotérico, que propunha transmitir nas entrelinhas saberes de um ensinamento teosófico mais profundo, ao tempo em que publicitava um “ensinamento popular de caráter edificante” (STRAUSS, 2015a, p.45).

PROPOSTAS DA PESQUISA

Para isto, o Diálogo Terceiro: Sobre a Origem do Amor será considerado mais detidamente que os diálogos anteriores. Espera-se, deste modo, que sua investigação específica elucide o ensino cabalístico dos Abravanel registrado na estrutura dos Diálogos de Amor.

PROGRAMA

O minicurso será ministrado em dois encontros de 04 (quatro) horas cada, seguindo o seguinte programa:

Apresentação
I. JUDÁ ABRAVANEL, o sefardita e seu ser-em-exilio
II. LEÃO HEBREU, o cabalista neoplatônico
II.1 Diálogos de Amor: características do texto
II.2 Mensagem Exotérica
II.2.1 Teologia do Amor de Judá Abravanel
II.2.2 Neoplatonismo de Leão Hebreu
II.3 Mensagem Esotérica
II.3.1 Sefirot, a árvore da vida
II.3.2 Modelo Teúrgico-Teosófico
II.3.2.1 Leitura Hebraica
II.3.2.2 Leitura Neoplatônica
II.3.2.3 Leitura Astrológica
II.3.2.4 Leitura Mitológica
II.3.2.5 Leitura Zodíaca
II.3.3 Modelo Mágico-Místico
Conclusão

BIBLIOGRAFIA

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